8 de dez. de 2011

Perspectivas

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- por Karol Felicio

 

Ando tão inchada de ideias que a qualquer movimento as palavras começarão a vazar por meus ouvidos e olhos. Ou pelo meu umbigo.

Acho que frio na barriga é umbigo querendo vazar ideias. Tantas e indizíveis que dentro de mim viram sons.

Estou uma orquestra descompassada. Vibração de mil tons.

Meu ouvido está aberto demais. Os olhos então...

A vertigem tenta me segurar em terra firme. Com tantos ouvidos e olhos viro balão de gás hélio.

E haja umbigo para esvaziar tanta ideia.

Meu corpo fluido escorre para todos os lados. Um turbilhão de pássaros dança em mim.

Espero por algo que me finque os pés. Como é difícil viver sem eixo!

29 de set. de 2011

Sobre escavar palavras



- por Karol Felicio

Poesia é sentimento em estado bruto, pensamento derramado antes do ponto de reflexão. Ebulição.


O ato solitário. O exercício de inverter-se. Mergulhar cabeça pescoço adentro, vestir-se de sangue quente e pulsação.

Escrever é, antes, escavar a alma e, ainda com as mãos sujas de terra, exibir a pedra sem lapidação. Coração.

Arrancar de si o sentimento e desvirar-se.

Escrever é deixar nascer, jorrar palavras, parir.

O escrito é o alívio pós- orgasmo.

7 de set. de 2011

Sumário

- por Karol Felicio

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Dos capítulos que ainda preciso desenvolver nesse estranho livro de estar vivo.


1. Da incompatibilidade entre viver em sociedade e ser plural

2. Do meu lugar no mundo

    2.1 Encontrar-se

3. “De gente fina elegante e sincera”

4. Inspiração e Boicote

    4.1. Do que – vindo de dentro – fala

    4.2. Do que – vindo de fora – cala

5. De pertencer a um mundo

    5.1. De pertencer a um grupo

6. Da pluralidade

    6.1. Da vida

    6.2. Da alma

7. Do exercício do livre-arbítrio

    7.1. Das conseqüências das minhas causas

8. Do querer

    8.1. Bem querer

    8.2. Mal querer

9. Da coragem

    9.1. Do medo

10. De importar-se demais

    10.1. De importar-se de menos

    10.2. Des-im-por-tar-se

11. Do sexto sentido

    11.1. Das sentidas falhas

    11.2. Do que não faz sentido

12. Da sede por justiça

    12.1. Do respeito

13. Da liberdade como oxigênio

    13.1. Do ciúme como alimento

14. Do (SER) eu (I) negar-se

15. Da culpa

    15.1. Da fala sem freios

    15.2. Da reflexão profunda

    15.3. Do martírio

16. De saber-se plural

    16.1. E única

17. Da vontade de comer o mundo

    17.1. Do cheiro recorrente da morte

18. Do que já sei, como verdade

    18.1. Do que ainda não sei, como lição

19. Da vontade e do medo de estar só

20. De acreditar que “isso de querer ser exatamente aquilo que a gente é ainda vai nos levar além”

    20.1. De desacreditar

21. Do julgamento

    21.1. De quem me leu a contra-capa

    21.2. De quem me dissecou as páginas

22. Do que anseia por compreensão

    22.1. Do que Foda-se!



22 de jul. de 2011

Um bom conselho




- por Karol Felicio

Com o passar dos anos tenho percebido – surpreendida - que os melhores conselhos vêm da minha avó. De outros conselhos, tenho que tirar a casca, a massa de ego, de orgulho, “re-s-sentimento” ou mesmo de sadismo, por que não?

Não que ela seja a dona da verdade, longe disso, abstraio o que nela está enraizado pela diferença de gerações, seus conceitos e pré-conceitos. Mas o que faz dos seus os melhores conselhos é serem despidos desses sentimentos escusos. Poupa-me o tempo de separar o joio do trigo, poupa-me a desconfiança sobre a intencionalidade das palavras, poupam-me palavras carregadas de acessórios. Interessa-me o significado.

A vantagem da avó é poder amar sem a posse que uma mãe, via de regra, tem de sua cria, sem o gozo do filho que vem suprir seus buracos. A minha avó sabe amar em liberdade, um amor que não aprisiona, não sufoca, não quer engolir, não faz do objeto desejado a sua vítima.

Imagine tentar – em vão – sonegar carinho, para que seu neto não sofra caso venha a faltar. Isso, para mim, é amar sem acorrentar. E sobre o deslize embutido nesse ato, alguém já disse “Qualquer erro por amor será perdoado”.

Nem entro no mérito de sua função nesta vida, de sustentar o peso encravado para manter unida uma família, de superar o que parece insuperável e seguir a vida com dignidade, cabeça erguida. E com toda a loucura que lhe é creditada por todos, ainda assim ser a melhor conselheira.

É, tenho desconfiado que minha avó seja minha alma gêmea.

23 de mai. de 2011

Uma canção

- Por Karol Felicio


Recolhe os cacos do chão, encera (até que brilhe), abre a janela

Na terra: planta, aduba e rega

O sol já vem lhe contemplar.

Emoldura esse sorriso na parede, é sua seta.

São tantos planos, ideias, metas,

Rasgue essa roupa, se liberta!

A engrenagem já está certa.

- agora cante uma canção -

A sensação é de que a vida já começa a funcionar.

30 de abr. de 2011

Outono em mim

- por Karol Felicio

Abri minhas portas para Cecília Meirelles e abriguei-a sobre minha cabeceira. Só então consegui enxergar a minha horta, murcha, e perceber que o impulso cego de regá-las diariamente e a todo instante já não lhe devolveriam à vida.


As minhas folhas, há tempos definhando, semimortas, secas, tortas. Minha raiz de tanta água , apodrecera. O sol queimava forte. Tudo era demais para mim. Era muita água e pouco nutriente. Era muito pouco consistente.

Dos meus olhos um filete de água queria sair e as comportas que eu construí já não poderiam suportar. Sabia-me que um rio estava por vir.

Meus pés sobre as folhas secas caminhavam a divertirem-se com os barulhos, rindo da própria desgraça, em círculos.

Nos meus cabelos verdes, pragas. E eu, sem dó, me despetalava. Sangrava pelos meus próprios espinhos, com as raízes fincadas num vaso, apertado, muito prestes a ruir.