12 de dez. de 2008

Sempre Sinto

- por Karol Felicio

Sinto sono e saudade
Sinto daqui o cheiro do cabelo do meu irmão
Mas longe de casa tudo é tão tarde
Que mal dá tempo de pregar os olhos

Sempre de saída e sempre atrasada
E passo tantas horas cantando
Que não tenho tempo de lembrar
O quanto sinto falta

Sinto o cheiro de bolo no forno
E o falatório matinal na cozinha
Uma buzina me acorda
Meu destino ficou há ruas atrás

Sempre me falta um abraço
Que soneguei quando estava por perto
E percebi quando já estava um deserto
Nos quilômetros que no peito me apertam

Sinto tudo longe aqui dentro
O coração ta sem lugar para escorar
Sei que ainda fico um tempo
Mas sempre sinto que é hora de voltar.

27 de nov. de 2008

Desvios

- por Karol Felicio

O vicio do amor
A ferida que marca
A marca que dói
A dor que não passa

Dizem que amar novamente sara
E aí a dor pára
E aí incha o peito
E aí mostra a cara

Mas se vem novo amor
É perigo dobrado
Latejar ritmado
Num coração ocupado
- Não lhe dê atenção! -
Aquilo fala baixinho
Aquilo sofre calado

É sorrir ou pesar
É pagar para ver
Ou prazer pra pagar
- caro -
É saber resultado
É insistir em errar
É pegar ou largar

Todo mundo tem um vício
Um fantasma
Um resquício
Uma dor que incomoda
Um machucado que coça
Que é melhor abafar
Porque se começa
Não consegue parar

Mas todo mundo tem balança
Para saber o que pesa
Para saber a que reza
A mente onde vaga
O que o corpo suporta
O que lhe vale a vida
O que lhe conforta a alma

Onde é que lhe toca
Nessa estrada já torta
Mil desvios de rota
O caminho a seguir

A seguir ou voltar.

11 de nov. de 2008

Bode Véio

- por Karol Felicio

Como não podia evitar a queda
Cuidou
Protegeu degraus,
Estofou todos eles
Mandou talhar cúpula de cristal
Para que cair não doesse assim


Pegou-a pela mão
- Não queria que andasse só -
Mandou buscar um bode no sertão
Só para ser diferente dos outros
Seu bichinho de estimação

Comprou, vendeu, trocou, desperdiçou
Atirou uma caixa de tomates maduros ao chão
Para brotar um sorriso, gargalhar

Mandou chamar Luiz Gonzaga só para tocar
Mesmo que fosse muito cedo
Um dia gostaria do baião
Da rede, do cheiro, do xote, do xenhenhen e da sanfona
“Carolina, humm, humm, hummm”

Aborreceu(-se), contrariou(-se), magoou(-se)
Porque ela cresceu, engatinhou, andou
Voou para longe
Mas resignou(-se), acalmou(-se), alegrou(-se)
Porque ela sempre voa de volta

Lapidou uma pedra forte
Daquelas que não se abalam, daquelas que não se apegam
Daquelas que fingem e mentem quando negam
Que a maior queda é ter um dia de largar a sua mão.

3 de nov. de 2008

Brincando de samba

- por Karol Felicio

Me acelera,
Depois acalma o meu desassossego
Quero guardar todos os seus beijos
Perder o senso, soltar os freios
Me desarmar

Me chama agora,
Então me mostra que não tem mais jeito
Que essa explosão aqui bem no meu peito
É um bom motivo para eu me entregar

Me leva longe,
Lá pro seu canto
Praia, sol, sossego
Me mostra o quanto eu vou dormir direito
Na poesia desse seu olhar

Vem amor,
E mata logo toda essa vontade
E ameniza um pouco toda essa saudade
Já corri tanto e agora
- quase tarde -
Eu me redimo só a te esperar

7 de out. de 2008

Descivilização

- por Karol Felicio

Onde confiança não é mais uma constante
quiçá moeda de troca

E a palavra de um homem não vale mais que escambo
com meia dúzia de quiabos

Quero lhe converter de valor em letras
e padecer em poucas linhas, lauda, poesia

E me deitar em tantas camas quentes
até que a sua esfrie, que nem me lembre

Quero mergulhar em tantas quedas d’água
que meu corpo limpe, até que me levante

E correr quantas léguas que minha alma acalme
Estire.

À sombra de uma copa larga, pingando mel de uma fruta farta,
que minha boca adoce.

E eu descanse.

10 de set. de 2008

Mantenha




- por Karol Felicio

Não se aproxime
Eu tenho espinhos
E acredite
Eles te sangram
Porque meus ressentimentos são mil flechas afiadas
Lançadas
E cada rosa que eu encosto despetala
E cada peito em que me deito dilacera

Eu tenho pressa em juntar meus cacos
Por isso corro, eu atropelo
Sigo caminho, choro os vestígios
Mas não olho para trás

Talvez assim, correndo tanto
O vento bata, e a dor abrande
Talvez por ter-me ofuscado os olhos
Eu não te enxergue nem a ninguém

Levam-me os pés que correm tanto
Nas pedras mil desse caminho
E vou seguindo assim sozinho
Desencantando uns outros tantos.

20 de ago. de 2008

...e quero assim

- por Karol Felicio

Quero alguém que decifre as minhas músicas
Que desvende os meus segredos
E venere os meus mistérios

Alguém para estancar todo esse sangue
a sensualidade contida e esse desejo que verte
e não encontra calhas onde escoar

Quero que percorra meus sons com os dedos
Que adentre essas cavernas
Que descubra esses caminhos

Alguém que termine as minhas deixas
Que, a cada frase que irrita, me complete
E a cada poro que grita, me liberte

Quero bom dia e a vontade de querer o dia inteiro
Quero gosto e quero cheiro
Quero toque e quero pele

Mas não quero tudo assim, exposto
Eu quero em partes, em etapas
E também não quero parte
Eu quero alguém. E quero inteiro.

10 de ago. de 2008

Horário de almoço

- por Karol Felicio

E vem assim sem nem licença pedir
Me olha assim
Como me fosse despir
As borboletas do estômago...
Chego a senti-las
Do estômago ao corpo inteiro
À flor da pele
E desconcerto
Mil mãos eu tenho e não sei onde enfia-las
E mil direções onde meu olhar não pára
Me dói o peito
De querer ficar mais
Mais um segundo
E já se vai
E esses minutos diários já não me bastam
E esses encontros casuais...vitais
Sem saber sua voz
- nem mesmo seu nome fala –
Mas a mão esquerda pesa
Não sei se por amor ou fardo
[E me dói mais]
Como posso senti-lo tanto
E não posso tocá-lo?

1 de ago. de 2008

Indigesto

- por Karol Felicio

Pobre da poesia que nasce na morte do amor
E daquela música que sorria
e agora toca e dói
Aquela foto que rasga e sangra
e aquela cama que chora e chora


Pobre do poeta que se alegra com a arte que faz
do estrago do seu próprio amor
Pobre do leitor, que admira a dor, mastiga as vísceras do poeta,
essa tristeza indigesta, engole num copo d’água,
fecha a tela, vira a página, sai, e nem olha para traz


Pobre dessa gente, por toda parte, que se ressente
A garota que dobrou a esquina, o moço que fechou a porta e afrouxou o nó da gravata,
Aquela senhora que passa, aquele menino que cala
Se quiser alegria dirija-se ao guichê ao lado
E tudo isso é matéria prima, vai dar à luz a algumas linhas, que, por hora, nem da gaveta saem

A gente produz muito lixo, anda descalço no esgoto
A gente faz amor com a peste, para nascer algo que preste
E às vezes a gente joga pérolas aos porcos
A gente escreve
E espera que alguém goste, ou que alguém deteste
Mas espera que alguém leia.

22 de jul. de 2008

Mais uma noite... à toa

-por Karol Felicio

A noite cai
Escura, gelada
Os 12º graus de sempre

O chuveiro quente
O corpo ferve
Aromas, vapor

Banheiro escuro
À luz de velas
Os olhos fecham
A mente voa
A boca pede
Mais uma taça de vinho à toa

Tinto
Vermelho da boca
O sangue esquenta
O frio da espinha sobe
O da barriga desce
E transborda

Uma onda de calor toma
Todo o corpo, todo o copo
E a garrafa seca
E molha, não nega

Lá longe a música
Toca, e toca
Um Chico à toa

A poesia voa
Não se prende no papel
Acalma a mente
Liberta a alma
De uma eterna espera
De não se sabe o quê

E o corpo estira
E a cama abraça
E o sono chega
E ela apaga

Mais uma noite boa
Uma noite à toa
Que acaba.

18 de jul. de 2008

Tanto faz

- por Karol Felicio

Não espero que você me ligue
Nem espero que reconsidere
Um passo mal dado, um impulso, um tropeço

Eu dispenso a reflexão
- sem mais delongas –
E disperso pensamentos-círculo
Eu me impeço de ser sensata e me safo desse martírio

Um ano ou uma noite
Sempre têm o mesmo fim
- final –
Feliz?
Nem sempre, nem me importa
O desfecho é sempre o mesmo

Então sem dramas, sem volta
Sem discursos treinados e devaneios chatos

O primeiro erro, a primeira noite
É pressuposto de um erro prolongado
Não espero que você me ligue
De qualquer forma não vai dar em nada

9 de jul. de 2008

Disposição

- por Karol Felicio

O amor, raízes fortes
Não me esforço, mas recebo água e luz
E me disponho a que ele brote
Disponho-me a sorrir, a conhecer, a chorar de dor
- porque dor de amor dói, mas é doce... –
E me disponho ao toque

Disponho-me a me expor, a conhecer
A te reconhecer em mim
- quem sabe –
E a me reconhecer em você

E de que vale tudo isso senão um renascimento a cada fim
E a cada chuva fina, a cada brisa, a cada dia, as folhas renascem
E a tarde cai, sorrindo
E a noite, menos fria
Então por que não receber?

Ah vida! Motivo melhor para viver?
Sorrir, sofrer, morrer, redescobrir, renascer
Por que não me disporia a você?

30 de jun. de 2008

O doce lado da verdade

- Karol Felicio

Sinceridade, honestidade – sem mais clichês

Sabendo de todas sempre me soube única
Com dedicatórias alheias, ouvia canções, sentia-as para mim
Imaginava-te chegando só, mesmo sabendo que o caminho de casa ainda esperava muitos desvios
E quando eram muitas... eu esperava
e sorria ao te ver chegar


O que parece estranho a outros olhos preenchia tudo aqui
Sem promessas e declarações, sem o amargo sabor da dúvida
Sem o maior dos elogios, sem a aspereza da insegurança


O amor está entre o coração de quem olha e o de quem sente
Não entre bocas e ouvidos
O amor está aí, mesmo que nunca citado
Mesmo que nunca existido


Sem mais contato, isso é o que fica.

15 de mai. de 2008

Uma presa, uma caça

- por Karol Felicio

E me caça esse olho de águia
Sem pudor, sem freios, sem fala
Com a força que vem e me cala
Há quilômetros, por instinto, veloz

E me larga indefesa, estática
Acuada, imóvel, amarrada
À espreita, um bicho, uma tara
Uma presa, frente-a-frente, o algoz

E te espero, sem resistência
E me exponho como banquete
E me entrego ao seu deleite
Te recebo, um animal

Fareja, envolve, invade
As gotas de suor que calham
Derretem meu rosto que arde
Minha boca concede e se abre

E só me despregue esses olhos
- nervosos de águia –
No buraco do tempo em que a música acaba
Na cera que derrete da vela que apaga
E a brasa queimada no canto da sala
Refaz o cenário da noite que cai

De um suspiro esgotado
Um corpo enxarcado
Um calor esganado
E minh’alma que vai

1 de mai. de 2008

Anjo

- por Karol Felicio

E reclusa à minha concha
Abriu-se um feixe de luz
E raiou o dia


Encontrei-me nos braços do aconchego

Enquanto meus olhos, ainda cegos, viram surgir o sorriso inesperado
Aquele sorriso, aquele olhar, aquele colo
Aquele cuidar. Sim! Aquele cuidar

Me resgataram do fundo
E me trouxeram um espelho inteiro
Não mais pedaços, não mais consertos

E eu me vi! Há quanto tempo sentia falta, há quanto tempo me procurei!

E ali, de volta ao que sou, a noite resgatou o sol
Ali, de volta ao início, meu anjo me resgatou de mim

E eu me vi!

Era um edredom aquecido numa noite fria

Mesmo que DEVA ser um sonho
Meu anjo... sempre será.

12 de abr. de 2008

Não é mais

- por Karol Felicio

Nem sei bem quando começou a ferver

Mas evaporou, evaporou...

E esse amor já não sufoca mais o peito, não estufa, nem mais preenche

Porque o amor não se resume à solicitude dos favores, nem à burocracia dos telefonemas com hora marcada para começar e minutos para terminar

O amor que supre está no tom da voz, na doçura do olhar, no aconchego do colo e no que mais piegas possa parecer

Mas tem de ter a temperatura certa do conforto e aquela inebriante tontura que aproxima e não quer largar

Agora parece aquele sonho bom, mas que o despertar não prolonga o sentimento e traz à tona a consciência do fim

E não é trágico, não dói, o dever foi cumprido, o prazo vencido

Apenas evaporou, evaporou...

E secou.

28 de mar. de 2008

Ausente em mim

- por Karol Felicio

Sim. Andei meio ausente.

Mas não foi de você. Foi de mim.

Meio calada, para assentar o turbilhão de vozes que gritavam aqui.

Até perceber que essas vozes não se calam nunca, às vezes baixam o tom para que eu possa falar. Só então posso ouvi-las, mesmo que não as entenda.

Andei muito longe, muito fundo, dentro de mim.

Queria dar a luz às estrelas como Nietzsche, mas a lua me encantou e perdi o rumo no caminho.

Agora chora aqui dentro a voz da saudade e me espero presente em ti.

Se ainda estiver vago, volto a esquentar meu lugar com um abraço apertado, um sorriso estampado e mais algumas histórias para contar.

8 de mar. de 2008

Resto

- por Karol Felicio

E se foi assim,
quando tudo era brilho, cor e a música era alta

Eu fiquei assim,
poeira e pó


Voltou mutilado, maltratado, manco
Um vaso mal colado,
Oferecendo o amor que não pudera dar

Mas agora o amor é resto, é meio, é quase
e não mais aceito
ou resto de mim ele tambem fará
.

28 de jan. de 2008

As mentiras que ELES contam...

- por Karol Felicio
Acho engraçado como os homens mentem. A impressão que dá é que são membros de uma confraria secreta na qual a regra-mãe é “Minta, em qualquer situação e sob qualquer pressão” no quesito “como lidar com as mulheres”.

E eles ficam tão patéticos mentindo!

É claro que por algum motivo insignificante um cara que sabe mentir (até que ele mesmo acredite que seja verdade), merece lá suas honrarias. Mas a maioria é de quinta categoria.

O cinismo é tanto que é capaz de um homem ao ser surpreendido, em pleno ato sexual, por sua mulher, continuar metendo e dizendo a tradicional “Meu amor, não é isso o que você está pensando”.

Enfim, existem os que mentem firmes, os que invertem o jogo (e a mulher já começa a achar que a louca é ela), os que ficam nervosos, os que começam a rir ou os que mentem chorando. E só isso já prova que os homens não são todos iguais.

Mas também existe uma minoria que, não tendo como negar, assume, abre o jogo, põe as cartas na mesa. Parecem frouxos? Que nada, são esses que logo após serem descobertos reconquistam a confiança da mulher amada imediatamente.

Porque a mulher tem um instinto peculiar do universo feminino pelo qual numa conversa tudo se resolve, desde que esteja convencida de que é amada, protegida, linda, segura e que tem a melhor trepada do mundo.

Já as “respectivas” da maioria podem ir embora ou continuar, acumulando mágoas e seguindo ao lado de um parceiro que agora é um corno em potencial.

Agora canta Jorge Ben, canta... Porque “se malandro soubesse como é bom ser honesto, seria honesto só por malandragem”. Caramba...